Rafael Bordalo Pinheiro, artista, boémio, mas não fadista, desde sempre fascinado pelo teatro, há muito terá confessado a Júlio César Machado:
“Eu não como, eu não bebo, eu não estudo, eu não sonho senão teatros! Teatros são a minha aspiração, são o meu bem!”
(in O Calcanhar de Aquiles – 1870)
Dizer que a figura e a obra de Rafael Bordalo Pinheiro permanecem como referências cimeiras de uma comunidade e mesmo de uma nação inteira constitui uma vulgaridade. A sua ação como satirista, ceramista, cartunista, jornalista, artista, empreendedor, decorador e professor não têm paralelo com qualquer outro nome da cultura portuguesa, seja em que época for. A versatilidade e profundidade da sua influência revela-se em cada recanto da nossa identidade nacional. O seu profundo culto pela liberdade, a sua repugnância veemente sobre todo o abuso, a intransigente independência de espírito, foram mais poderosas do que a censura que sempre o tentou silenciar. A imensa popularidade do seu inesgotável humor, sempre mordaz, certeiro e indispensável fizeram de Bordalo a musculatura moral de um país. Um reino que amargava escândalos sucessivos que uma classe política inepta e corrupta procurava esconder e disfarçar. Mas havia Bordalo e havia a sua caneta. Não havia como escapar ao seu crivo. As numerosas ameaças à sua liberdade e à sua vida, de que se soube sempre, de um modo ou outro, esquivar, legaram-nos um património ético que precisamos sempre de revisitar e de celebrar. Como poderemos nós preservar o seu legado sem desdourar a sua memória? Como poderemos nós surpreender este homem, imperfeito e cidadão de fibra? Como será que Bordalo Pinheiro iria patear o nosso regime? Gostaria ele de viver os nossos dias? Teria ele algo a ensinar-nos? Gostaria ele de nós? Devemos ao homem, ao artista, imperfeito, temperamental e brilhante, a urgência de estar sempre à altura do seu génio. No ano em que comemoramos os 50 anos do advento da democracia, não invocar Bordalo Pinheiro é desmerecer o seu inestimável contributo para a robustez da liberdade de expressão, para a dignificação de um povo e para a afirmação da estatura artística da identidade portuguesa. “Parece Bordalo” representa a melhor e continuada fórmula para a devida celebração do nosso patrono que continua a exigir de nós um espírito constante de vigilância democrática, uma inesgotável energia e uma veemente audacidade criativa, fatores indispensáveis para a construção de um futuro melhor. Parece Bordalo. O Projeto Cultural de Escola propõe a toda a comunidade educativa o desenvolvimento artístico, assente em todas as áreas do saber, cumprindo os “movimentos” da caneta de Bordalo.
Porque…
– se temos alunos que fazem uma sátira bem-feita, Parece Bordalo
– se temos alunos que são críticos, Parece Bordalo
– se temos alunos que respeitam a liberdade de expressão comemorando os 50 anos da democracia e liberdade, Parece Bordalo
– se temos alunos que se destacam na representação gráfica e no desenho, Parece Bordalo
– se temos alunos empreendedores, Parece Bordalo
– se temos alunos que constroem bem um texto e o apresentam à turma de forma exemplar, Parece Bordalo
– se temos alunos com humor, Parece Bordalo
– se temos alunos e professores que desenvolvem e realizam a técnica ceramista, Parece Bordalo
– se temos alunos a representar com primazia, Parece Bordalo
– se temos alunos, professores e funcionários que decoram bem os seus ambientes de trabalho e de vivência, Parece Bordalo
– se temos professores que todos os dias fazem o seu melhor, Parece Bordalo
E, tal como Bordalo, que encontrou o amor da sua vida em cima do Palco, história de amor documentada pela autora Isabel Castanheira (in Una Piccola Storia D’Amore – 2018), o nosso Agrupamento vai este ano ao Teatro tornando-se no rosto da organização do XLIII.º Encontro Nacional de Teatro na Escola, Parece Bordalo.
Os Encontros de Teatro na Escola (E.T.E.) são organizados desde há quarenta e cinco anos (desde 1979) e constituem um momento de reflexão e de troca de experiências no campo da Expressão Dramática e Teatral com uma mostra do que de melhor se faz nas nossas escolas.
O sucesso das anteriores edições muito contribuiu para um aumento de participações e uma maior adesão de grupos e de escolas, pelo que se constituiu uma Associação Cultural, com personalidade jurídica, que delega anualmente em uma ou mais escolas sócias a coordenação do encontro anual.
Porque se acredita no associativismo e na colaboração de pares neste encontro, iremos acolher e apoiar ateliês de formação para alunos e professores, produções teatrais, criação de espaços de visibilidade para o teatro feito em contexto escolar. É neste ambiente de partilha de experiências e saberes que o Agrupamento se propõe a organizar este Encontro de projeção nacional.
Coordenadora do Plano Cultural de Escola – Plano Nacional das Artes
Cecília Pimenta Correia
outubro de 2023